Da fragilidade e da redescoberta – II edição

Tava ali parado, esperava nada da vida. Naquele momento, muito menos. Dias iguais, noites idem. Coisa alguma no mundo poderia me despertar da inércia. Tolo. Era isso que eu pensava. Um simples descuido, deslize bobo e ela surgiu do inesperado. O que era casual, ou pelo menos, despretensioso, me tomou de repente. O que era aquilo, afinal? Era mesmo o que eu tanto havia esperado e, por isso, não acreditava mais ser possível?

 

Obviamente, minha estupidez habitual não me deixou perceber de cara. Só me dei conta quando, numa noite, algo me parecia faltar… horas e mais horas pensando… uma única imagem na cabeça. Desviei o pensamento, mas não havia porquê fazê-lo. Talvez a razão estivesse no fato de eu não acreditar nem um milímetro em novas paixões. Com outros, sim. Comigo?!… Nem que o céu se tornasse eterna e profundamente vermelho. Do desvio fui ao delírio. Lembrei-me do profundo castanho dos seus cabelos e da forma como eles voavam ao vento suave da orla. Revi sua pele morena que, ao sol de setembro, parecia tingida de canela. Seu cheiro de repente invadiu o quarto e quase holograficamente a vi. Minhas pernas tremeram e o chão parecia estar a quilômetros dos meus pés. Sua voz suave parecia vir de muito perto e já não pude deixar de notar o quanto meu coração estava acelerado. Segurei minhas mãos. Suavam frio como em febre alta.

 

Eu, tão seguro de mim, me vi novamente caído, cercado e sem saída. Tive medo. Por mais que eu dissesse que o passado era algo resolvido, não poderia esquecer que já sofri, e muito, por amores. Primeiro, os não correspondidos. Depois, os impossíveis. Por fim, os mal sucedidos. Mais medo. Na verdade, pavor. A cada lembrança de sua imagem, me via num paradoxo: me sentia seguro e ao mesmo tempo sem o mínimo controle de mim. As ondas de seus cabelos imitando as do mar me deixavam sem reação. O balanço suave de seu corpo caminhando me fazia sorrir. E suas curvas me conduziam sem escalas à felicidade.  Pensei em pedir socorro. Mas a quem?! E por que?! Medo, medo, medo. Era todo esse temor que fazia do céu uma prefiguração do purgatório. E se não fosse possível? E se ela não me notar como espero? E se eu não for aquilo que ela espera? Depois de um passado tão identificado pela perda, a insegurança era parte de mim.

 

Levou tanto tempo pra eu me sentir humano novamente que não podia acreditar. Aqueles sentimentos não faziam mais parte do meu pobre léxico, muito menos da minha medíocre existência fora do mundo real. Como foi bom me sentir vivo novamente. Pela paixão e pela limitação, era eu de novo… aquele que havia esquecido de si num súbito assustou-se com sua condição frágil e tangível. Cansei de resistir. O que virá? Importa menos o que, e mais a essência da descoberta, ou redescoberta, sendo mais exato. À dor ou à felicidade, é a isso que somos conduzidos. Me exponho pra me manter vivo, me mostro pra que não me esconda outra vez.

 

 

 

 

26 comentários

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26 responses to “Da fragilidade e da redescoberta – II edição

  1. Eu apóio a exposição. Na verdade, é tudo que eu jamais pediria a vc e vc sabe. Se exponha. Seja pros outros a pessoa incrivel que vc é. Eu sei que tudo vai dar certo se assim for.
    Ah, só uma pergunta. É impressão minha ou os blogs sempre vêem com uma paixão? =)
    Já estava feliz hoje, agora estou megamente feliz.
    love u, xuxu

  2. só uma correção: te amo xuxu mesmo vc sendo esse canalha cretino que me engana.
    bjs,

  3. Amanda

    Oi, amado!
    tudo bem?
    Fiquei totalmente envolvida com esse texto que vc escreveu. Apesar de ele ser ficcional, o contexto era tão profundo que parecia real. Me vi em vários momentos nele. rs
    Parabéns!
    Mais uma vez digo que sou apaixonada por tudo
    que vc escreve. Beijão carinhoso. te adoro.

    • Wellington Campos

      Oi, querida! Comigo está tudo bem. Espero que com você também.

      Quanto ao texto, acho que a gente tenta dar um toque lírico àquilo que todo mundo sente, mas não expressa. Daí fica fácil se identificar. A paixão é condição da alma humana, assim como o temor e a surpresa.

      Obrigado.

      Um beijo no coração!

  4. Identificação imediata.
    Isso sim…lendo todo o texto, o que se segue é uma verdadeira projeção de si mesmo.

    Todos nós somos assim e poucos conseguem expressar tão bem quanto você.

    Abraços

    Leus.

  5. Di

    Delícia! Delícia!!!
    Você, heim?! Nos enganou direitinho… rs…
    Beijocas!

    • Wellington Campos

      A gente, que gosta de escrever, é assim, né?

      Tem dia que gosta de falar da realidade, em outros de criar em cima dela.

      Beijo grande.

  6. Daniel

    Caraca, meu amigo, acho que você roubou meu texto haha

    Grande abraço!!

    • Wellington Campos

      Fala aí, Daniel. Bem-vindo!

      É fácil a gente se identificar com aquilo que faz parte da existência de qualquer homem, não? Acho que todos já nos perdemos de paixão, ficamos amedrontados e tivemos que nos render à nossa fragilidade.

      Sinta-se à vontade para voltar e comentar.

      Grande abraço, mano velho.

  7. Ingrid

    Amigo, essa propriedade nas palavras demonstram uma porcentagem pequena de ficção… mas da próxima vez que pensar em mim, toma uma Dipirona ou uma Bromoprida. (KKKK) Se não dissesse uma besteira, essa de fato, não seria eu.

    Amo tu Irmão!!!

  8. Joao Ledo Fonseca

    Belissimo texto. Achei excelente a forma como você foi capaz de modelar o tema sem demasiada definição, sem demasiada revelação, apenas com as palavras certas…

  9. Rapaz, mas não é que você escreve ficção da melhor qualidade mesmo?

    Não esperava!

    “Me exponho pra me manter vivo, me mostro pra que não me esconda outra vez”: trata-se de uma profissão de fé!

    Bom conhecer lados inesperados de pessoas com quem a gente convive!

    Obrigado por cada comentário lá no blogue! Significa muito pra mim!

    Abraço forte!

  10. SHIRLEI CAMPOS

    OI WELLINGTON NEM PRECISO FALAR QUE GOSTEI MUITO …. GOSTEI É POUCO…… CHOREI…. KKK BJS DE SUA MIGUXA !

    • Wellington Campos

      Valeu, Shirlei.

      Na próxima vez, quando começar a ler o texto e achar que vai chorar, usa um pacotinho de lenços descartáveis. Evita de cair líquido no seu computador… rsrsrs

  11. Iris Correia

    Não gostei desse texto. Pra falar a verdade, não gosto de nada que você escreve… Por que todo mundo tem que ser agradável? rs

    Sério, você sabe que eu gostei. Sua pegadinha não me engana. Seria o acontecimento do ano você expor fatos e sentimentos tão … particulares em um blog! rsrsrs

    amu tu, xuxu

    • Wellington Campos

      Ah, tá! Nem com muita imaginação é fácil pensar em me ver expondo esse tipo de situação aqui.

      Como você, atenta, já deve ter notado, gosto mesmo é da provocação. Gosto até de deixar alguns mais confusos sobre a veracidade dos fatos. Se não são verídicos, que sejam críveis, ao menos. rs

      Essa mania que o povo tem de ser agradável é fogo! Só me causa um (in)certo estímulo à escrita e me faz pensar que enquanto houver leitores haverá quem escreva.

      Amo tu, Xuxu.

  12. Bel

    Amei seu texto… como sempre, seu(s) blog(s) é (são) viciantes, já salvei como Favorito aqui…

    Beijo enorme!

    • Wellington Campos

      Ih, que surpresa boa! Suas visitas são sempre muito bem-vindas, e seus comentários igualmente.

      Sinta-se à vontade nesta casa.

      Obrigadão. Beijo.

  13. Meu amigo, tomei a liberdade de linkar seu blogue ao meu!

    Coisa boa tem é que ser divulgada!

    Abraço!

  14. Gabriel Cunha

    Fala Wellington!
    Marcando presença dos teus alunos aqui!
    Achei lindo o texto, é daqueles que depois de uns 10 segundos você ( eu pelo menos ) absorve de tal maneira que influencia meu pensamento no restante do dia! “…minha medíocre existência fora do mundo real…” nossa, essa aí merece recortar, colar e emoldurar!

    Realmente, ficção da melhor qualidade!

    Abraço, ex- companheiro de dúvidas de sextas-feiras à noite!

    • Wellington Campos

      Fala, Gabriel!
      Obrigado pela presença marcada. Suas visitas aqui serão sempre bem-vindas.

      Forte abraço e boa semana.

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